Introdução
A Ordem Profissional dos Auditores e Contabilistas Certificados (“OPACC” ou “Ordem”) foi criada pelo Decreto-Lei nº 12/2000, de 28 de fevereiro, que aprovou o respetivo Estatuto, em conformidade com as bases de criação e regime das Ordens Profissionais, então definidas na Lei nº 126/IV/95, de 26 de junho.
Entretanto, a Lei nº 90/VI/2006, de 9 de janeiro, aprova um novo regime jurídico das Associações Públicas Profissionais, atualmente em vigor, cujo artigo 56º determina a revisão dos estatutos das associações públicas existentes.
Uma das novidades do novo regime jurídico das Associações Públicas Profissionais é a regionalização das Ordens Profissionais, dotando-as de assembleias regionais e órgãos de fiscalização e disciplina regionais, pois que o regime anterior já previa órgãos diretivos regionais para cada Delegação ou Comissão Regional das Ordens.
Por outro lado, em 2012, é publicado o Relatório ROSC A&A Cape Verde (Report on the Observance of Standards and Codes of Auditing and Accounting), elaborado sob os auspícios do Banco Mundial, o qual recomenda, entre outras, a atualização dos curricula e programas das formações de acesso à profissão contabilística, conformando-os com os adotados internacionalmente, no âmbito da International Federation of Accountants (IFAC).
A acrescentar, são de mencionar muitas outras razões que motivavam uma revisão do Estatuto da Ordem Profissional dos Auditores e Contabilistas Certificados, destacando:
a) A necessidade de explicitar o dever dos contabilistas e dos auditores certificados de participar ao Ministério Público os factos, detetados no exercício das suas funções de interesse público, que indiciem a prática de crimes públicos, e, tratando-se de crimes de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, fazer a mesma comunicação à Unidade de Informação Financeira (UIF);
b) O combate à tendência crescente de exercício ilegítimo das profissões de contabilista e de auditor certificados, prevendo o recurso a procedimento judicial e ou à imposição de coimas, por motivo de exercício ilegal ou irregular de profissão titulada, lesando o interesse público;
c) A introdução de critérios de maior representatividade dos membros efetivos da Ordem, na gestão da instituição, nomeadamente na eleição do Bastonário e dos titulares dos órgãos nacionais e regionais, mediante a introdução da regra da paridade entre os auditores e os contabilistas certificados, etc.
A lei instituinte e as regras de transição do antigo para o novo Estatuto da OPACC
O novo Estatuto da OPACC foi publicado através da Lei nº 82/IX/2020, de 26 de março, e entrou em vigor no dia 27 do mesmo mês.
Antes de nos debruçarmos concretamente sobre o Estatuto, convém referir que a Lei que o institui, no seu artigo 2º, prevê a manutenção em funções dos atuais órgãos da Ordem, e dos seus titulares, até ao término dos respetivos mandatos.
No artigo 3º, estabelece que continuam válidos, com as necessárias adaptações, os regulamentos internos em vigor, até a aprovação de novos regulamentos.
Por outro lado, no artigo 4º, sobre disposições finais e transitórias, salvaguarda os direitos adquiridos dos atuais membros efetivos e estagiários para contabilista e para auditor certificados e estabelece algumas normas de transição e um conjunto de prazos de adaptação às novas exigências estatutárias, prevendo nomeadamente que:
a) As regras aplicáveis aos exames e à eventual dispensa parcial ou total do exame, vigentes à data de entrada em vigor da Lei, continuam a aplicar-se aos candidatos a admissão na Ordem, até 31 de dezembro de 2020;
b) Os atuais contabilistas certificados, com pelo menos dez anos de exercício efetivo da atividade, e que possuam habilitação académica mínima de 12º ano ou equivalente, podem transitar para auditor certificado desde que efetuem o exame para auditor certificado nas matérias do grupo III e do grupo IV do artigo 60º do Regulamento de Admissão, Estágios e Exames, atualmente em vigor, até 31 de dezembro de 2021, e realizem o subsequente estágio profissional para auditor certificado.
c) As atuais sociedades de auditores e de contabilistas certificados dispõem de um prazo máximo de seis meses, desde a entrada em vigor da Lei, para adequarem, se necessário, o seu contrato societário e ou registo na OPACC;
d) As sociedades de auditoria, de projeção internacional, entendendo-se como tal as que são membros do Forum of Firms da IFAC, que à data da entrada em vigor da Lei estejam a exercer continuamente a atividade em Cabo Verde, nos últimos cinco anos, devem constituir uma sociedade ou instalar uma representação permanente, nos termos da lei cabo-verdiana, e proceder ao seu registo transitório na Ordem, no prazo de sessenta dias. Por outro lado, devem regularizar o seu contrato societário e ou registo na OPACC, de acordo com o previsto no novo Estatuto para as sociedades de auditores e de contabilistas certificados, até 31 de dezembro de 2023.
O novo Estatuto da OPACC e as suas alterações mais significativas
Os porquês da revisão do Estatuto da OPACC
O novo Estatuto da OPACC, aprovado pela Lei nº 82/IX/2020, de 26 de março, tratando-se de uma revisão do primeiro Estatuto da Ordem, aprovado pelo Decreto-lei nº 12/2000, de 28 de fevereiro, pretendia, antes de mais, atualizar o seu conteúdo, tendo em conta os anos decorridos, e consequentemente, a experiência na sua aplicação e as alterações operadas a nível legislativo, no país, e normativo, a nível internacional.
A nível legislativo, no país, há que referir a aprovação do citado novo regime jurídico das Associações Públicas Profissionais, pela Lei nº 90/VI/2006, de 9 de janeiro, que impunha a atualização dos estatutos das Ordens, estando, portanto, a OPACC em claro incumprimento daquela disposição legal, não obstante ter dado sempre primazia dessa lei em relação ao Decreto-lei da sua criação, sempre que fossem contraditórios.
A nível do normativo internacional, é de referir que o anterior Estatuto da OPACC impunha, sempre, a par e passo, ao longo do seu texto, o objetivo de adoção das boas práticas internacionais da profissão contábil, conforme estabelecidas pela International Federation of Accountants (IFAC).
Entretanto, em 2012, já o referimos, surge o Relatório ROSC A&A Cape Verde, elaborado sob os auspícios do Banco Mundial, que reitera os mesmos objetivos de aderência às boas práticas internacionais da profissão contábil, para além de outras recomendações de política, a serem eventualmente adotadas pelo Governo, de modo a reforçar o interesse público imanente da contabilidade e da auditoria, mormente a nível da adoção dos normativos internacionais de referência, e da introdução da supervisão da auditoria das entidades de interesse público, incluindo o setor financeiro, bancário e segurador, fundos de investimento e sociedades de corretagem, etc., entidades cotadas e sociedades privadas e de capitais públicos de grande dimensão.
Portanto, o novo Estatuto da OPACC, por um lado, passa a integrar as disposições do novo regime jurídico das Associações Públicas Profissionais, nomeadamente a nível da organização, processo eleitoral, direitos, deveres e garantias dos membros, regras disciplinares e de resolução de conflitos. Por outro lado, passa agora a explicitar, ao longo do seu texto, os normativos internacionais que serão adotados, incluindo as regras de acesso à profissão, de ética e deontologia, de desenvolvimento profissional contínuo, de controlo de qualidade e de responsabilidade profissional. O Estatuto da OPACC apresenta-se, agora, estruturado nos seguintes capítulos:
Capítulo I – Disposições Gerais
Capítulo II – Estrutura e Funcionamento da Ordem
Capítulo III – Consultas Internas
Capítulo IV – Regime Eleitoral
Capítulo V – Organização e Funcionamento dos Órgãos
Capítulo VI – Exercício da Profissão
Capítulo VII – Regimes de Exame e Estágio Profissional
Capítulo VIII – Acesso à Profissão
Capítulo IX – Quotização, Suspensão e Cancelamento da Inscrição
Capítulo X – Sociedades
Capítulo XI – Ética e Deontologia
Capítulo XII – Desenvolvimento Profissional Contínuo
Capítulo XIII – Controlo de Qualidade
Capítulo XIV – Responsabilidade Profissional
Capítulo XV – Responsabilidade Disciplinar
Capítulo XVI – Resolução de Conflitos
O quadro a seguir apresenta a estrutura do novo Estatuto da OPACC comparado ao anterior Estatuto da Ordem:
Afinal, em substância, quais são as principais diferenças do novo Estatuto da OPACC relativamente ao anterior?
Alterações relevantes nas categorias de membros da Ordem
A OPACC mantém a sua independência e não vê alterada as suas atribuições, que continuam basicamente as seguintes:
a) Superintender em todos aspetos relativos ao acesso às profissões de contabilista e auditor certificados;
b) Promover e defender a função social, dignidade e prestígio dos contabilistas e auditores certificados;
c) Promover e contribuir para o desenvolvimento profissional contínuo dos membros da Ordem;
d) Definir, difundir, promover e fazer cumprir princípios e normas de ética e deontologia profissional;
e) Representar e defender os interesses, direitos e prerrogativas da profissão e seus membros;
f) Certificar os membros da Ordem e emitir as respetivas cédulas profissionais;
g) Definir normas e padrões técnicos de atuação profissional e de controlo de qualidade dos serviços;
h) Exercer jurisdição disciplinar no exercício da profissão e no cumprimento do Código de Ética;
i) Organizar e manter uma biblioteca técnica e promover a edição de publicações técnico-profissionais;
j) Emitir parecer ou propor medidas legislativas e de outra natureza relativas à contabilidade e auditoria;
l) Organizar e manter atualizada a lista nacional de auditores e de contabilistas certificadas;
m) Participar no ensino e na realização de estudos, trabalhos e investigações de contabilidade e auditoria, etc.
Contudo, para além dos membros efetivos, correspondentes e honorários, passa a poder contar com membros estagiários (os estagiários para contabilista e para auditor certificados não eram considerados membros da Ordem) e com membros associados.
Os membros associados são, por um lado, as pessoas singulares de profissões complementares, titulares de diploma de formação superior ou de diploma de formação técnico-profissional equivalente, nomeadamente as que exerçam funções em entidades públicas ou privadas como auditores internos, diretores financeiros, controladores de gestão, chefes de contabilidade e tesouraria, juristas especializados em matérias económicas e financeiras, ou como docentes de contabilidade e finanças, auditoria e disciplinas complementares.
Por outro lado, os profissionais que desempenham funções públicas relevantes, similares às dos profissionais de contabilidade e de auditoria inscritos na OPACC, titulares de diploma de formação superior ou de diploma de formação técnico-profissional equivalente, incluindo os funcionários públicos que exercem a atividade de técnicos de contas, inspetores de finanças, inspetores tributários, auditores do Tribunal de Contas ou funções similares, os quais podem ser membros associados da OPACC quando não inscritos como membros efetivos.
De realçar que, os membros estagiários, associados, correspondentes e honorários não são auditores ou contabilistas certificados. Podem participar e beneficiar da atividade social, cultural e científica da OPACC e informar-se da sua atividade, mas não possuem o direito de voto ou de fazer parte de qualquer dos órgãos.
Alterações relevantes a nível dos órgãos centrais e regionais
A nível dos órgãos centrais da Ordem, a alteração é significativa, pois, desaparecem o Conselho Técnico, o Conselho Disciplinar e o Conselho Fiscal, sendo que as funções do Conselho Técnico são absorvidas pelo Conselho Diretivo e é criado o Conselho de Disciplina e Fiscalização, que assume as funções dos anteriores Conselho Disciplinar e Conselho Fiscal.
Desaparecendo o Conselho Técnico, órgão eleito, quiçá dos mais importantes da Ordem, mas que aparentava ser um órgão de apoio ao Conselho Diretivo, e passando as competências decisórias a estarem concentradas no Conselho Diretivo, houve a necessidade de criar órgãos de consulta e apoio técnico-profissional ao Conselho Diretivo. Esses órgãos são a Comissão Consultiva e as Comissões Técnicas de Contabilidade e de Auditoria. Por outro lado, ficou prevista, tal como dantes, a possibilidade do Conselho Diretivo criar comissões especializadas, e agora o cargo de secretário-geral, e definir as respetivas competências e condições profissionais.
A Comissão Consultiva, presidida pelo Bastonário, integra o próprio Bastonário, o Vice-Presidente do Conselho Diretivo, os cinco Vogais do Conselho Diretivo, os Presidentes e Vice-Presidentes das Comissões Executivas Regionais do Sotavento e do Barlavento e os três Vogais de cada uma das Comissões Executivas Regionais.
Cabe à Comissão Consultiva dar parecer sobre os planos de atividade e orçamentos e sobre os relatórios de atividade e contas; sobre a concessão a algum ou alguns dos titulares dos órgãos sociais de abonos ou remunerações, tendo em conta o seu grau de disponibilidade e afetação horária; sobre o projeto do Código de Ética e Deontologia Profissional a aprovar em Assembleia Geral, bem assim sobre os regulamentos que devam ser aprovados pelo Conselho Diretivo e sobre todos os assuntos que lhe sejam submetidos pelo Conselho Diretivo e Conselho de Disciplina e Fiscalização; e dar parecer sobre o montante das quotas, taxas e emolumentos a cobrar.
Às Comissões Técnicas de Contabilidade e de Auditoria, como o próprio nome indica, cabem prestar ao Conselho Diretivo assessoria em matéria técnico-profissional da sua especialidade, mormente assegurar o rigoroso cumprimento dos requisitos exigidos no Regulamento de Admissão, Estágios e Exames; analisar e emitir parecer sobre os processos de admissão e inscrição para o exercício das profissões de contabilista e de auditor certificado e de registo das sociedades de contabilistas e de auditores certificados; elaborar ou analisar projetos de normas e padrões técnicos de atuação profissional, de controlo de qualidade e de desenvolvimento profissional contínuo; fomentar o estudo, a investigação e os trabalhos que visem o aperfeiçoamento das doutrinas e técnicas contabilísticas, visando a sua divulgação e análise pelos membros da Ordem, etc.
A nível dos órgãos regionais, a alteração é também importante, pois, deixa de haver, simplesmente, uma Direção da Comissão Regional e são criados a Assembleia Regional, a Comissão Executiva Regional e a Comissão de Disciplina e Fiscalização Regional.
A Assembleia Regional é definida como o órgão deliberativo regional da Ordem na respetiva circunscrição territorial e compõe-se de todas as pessoas singulares que estejam certificadas como membros efetivos, no pleno gozo dos seus direitos associativos e com domicílio profissional na região. A Comissão Executiva Regional é o órgão colegial de administração e gestão da Ordem a nível da correspondente região, sem prejuízo das competências conferidas ao Bastonário e ao Conselho Diretivo. A Comissão de Disciplina e Fiscalização Regional é o órgão colegial regional da Ordem que exerce o respetivo poder disciplinar, aplicando as sanções previstas na lei, no Estatuto e respetivos regulamentos, na respetiva circunscrição territorial, e zela pela fiscalização e controlo da legalidade e da gestão económica e financeira da Comissão Regional.
Introdução das consultas internas facultativas ou obrigatórias
Uma novidade do novo Estatuto da OPACC é a possibilidade da Ordem poder promover consultas internas, com natureza vinculativa ou consultiva, sobre questões de particular relevância para as profissões de auditor e de contabilista certificados ou para a Ordem, conforme deliberação da Assembleia Geral nacional ou a pedido apresentado por um quinto dos membros efetivos com inscrição em vigor.
Estabelece o novo Estatuto da OPACC que são obrigatoriamente submetidas a consulta interna as propostas de alteração do Estatuto e de adoção do Código de Ética e Deontologia Profissional, a submeter posteriormente à discussão e aprovação da Assembleia Geral.
Introdução da regra da paridade na gestão da Ordem
Também marcante no novo Estatuto é a introdução da regra da paridade, estabelecendo que o Conselho Diretivo e as Comissões Executivas Regionais devem ter como titulares os auditores e contabilistas certificados em igual número, não sendo contados para o efeito os respetivos presidentes. Por outro lado, sendo o presidente do órgão executivo nacional e regional um auditor certificado, o vice-presidente deve obrigatoriamente ser um contabilista certificado, ou vice-versa.
Tal regra é uma reivindicação antiga dos contabilistas certificados, que se viam inferiorizados na gestão da Ordem. De facto, o anterior Estatuto tinha-se baseado na legislação brasileira do Conselho Federal de Contabilidade, que atribuía predominância na gestão dos Conselhos Regionais de Contabilidade e do Conselho Federal de Contabilidade aos contadores (bacharéis em ciências contábeis) em detrimento dos técnicos de contabilidade (diplomados a nível técnico-profissional), à razão de dois terços e um terço, respetivamente.
O motivo residia no facto de os contadores serem, efetivamente, o grupo que detinha uma formação académica mais elevada, a nível de “bacharel”, e as ordens profissionais brasileiras seguiam a lógica de integração vertical de todos os profissionais de um dado ofício na mesma associação profissional.
Compreendendo e querendo satisfazer a reivindicação dos contabilistas, pois afinal o requisito de base, atualmente, para entrada na Ordem, tanto para contabilista como para auditor, é a posse de um diploma de ensino superior, deixou de fazer sentido a regra da predominância dos auditores na gestão da instituição.
Foi estabelecida a regra da paridade e simultaneamente foram criadas as duas Comissões Técnicas, de Contabilidade e de Auditoria, de modo a que os pareceres técnicos a nível de cada profissão sejam emitidos pelos respetivos pares, até porque, efetivamente, não obstante o requisito de base, de formação académica a nível de licenciatura ou equiparado, o acesso à profissão de auditor certificado implica exigências adicionais, de formação académica complementar, nos exames na Ordem e na duração do estágio acompanhado pela Ordem.
Alterações relevantes a nível do exercício da profissão, incluindo o combate ao exercício ilegal
Relativamente ao exercício profissional dos contabilistas e dos auditores certificados o novo Estatuto da OPACC não traz alterações substanciais, exceto que é retirada a exclusão dos contabilistas da administração pública serem obrigatoriamente inscritos na Ordem. Efetivamente, tudo indica ser intenção do Ministério das Finanças passar a recrutar contabilistas certificados, para exercer a função de contabilista na administração pública.
Uma outra inovação do novo Estatuto da OPACC é o facto de ter-se resolvido dar combate ao exercício irregular e ilegal da profissão contábil em Cabo Verde.
Particularmente no que se refere ao exercício ilegal das profissões de contabilista ou de auditor certificado, fica estatuído que, quem exercer ou utilizar qualquer designação que dê a entender a existência de uma prática certificada das referidas profissões e ou praticar atos próprios das mesmas profissões e ou auxiliar ou colaborar na sua prática é punido com a pena do crime de exercício ilegal de profissão titulada, se outro não couber nos termos da lei, assim é dito.
A OPACC fica com legitimidade para se constituir assistente no procedimento criminal por exercício ilegal da profissão de contabilista ou de auditor certificado.
Por outro lado, considera-se que os atos criminosos praticados presumem-se culposos, para efeitos de responsabilidade civil, e a OPACC fica também com legitimidade para intentar a ação de responsabilidade civil, pela violação da Lei, tendo em vista o ressarcimento de danos materiais e morais decorrentes da lesão do interesse público que lhe cumpre assegurar e defender. As indemnizações serão consignadas aos gastos com formadores e membros de júris no âmbito de ações de formação e realização de exames de admissão na Ordem.
Alterações a nível do acesso à profissão e explicitação dos regimes de exame e estágio profissional
O novo Estatuto da OPACC estabelece que o acesso à categoria profissional de contabilista certificado é, agora, reservado aos titulares de um diploma de formação de ensino superior de um mínimo de quatro anos, ou de formação técnico-profissional oficialmente equivalente, nas áreas de Contabilidade, Auditoria, Administração ou Gestão, Economia, Finanças e noutras de natureza similar que sejam reconhecidas pela Ordem, e que, tratando-se do acesso à categoria profissional de auditor certificado deve acrescer uma formação especializada, numa Instituição de Ensino Superior, com duração de pelo menos um ano letivo, de aprofundamento das matérias relevantes para a prática profissional de auditoria.
O novo Estatuto da OPACC dedica, também, um capítulo separado aos regimes de exame, na Ordem, e de estágio profissional, acompanhando pela Ordem, os quais se baseiam no normativo internacional da IFAC.
Estabelece que tanto para contabilista certificado como para auditor certificado o exame é obrigatório, salvo as eventuais situações de dispensa parcial do exame, contempladas no Regulamento de Admissão, Estágios e Exames. Refere que o exame visa apurar a obtenção do nível de conhecimento ou o grau de suficiência do mesmo, nas matérias que conferem as competências profissionais teóricas para o exercício da profissão, conforme estabelecido nas International Education Standards (IES) da IFAC, nomeadamente na IES 2, IES 3 e IES 4, para contabilista certificado, ao que adiciona a IES 8, para auditor certificado.
Reportando às citadas normas internacionais de formação IES 2, IES 3 e IES 4, explicita as seguintes matérias de exame e o nível de conhecimentos exigido, para cada uma:
a) Contabilidade e Reporte Financeiro (nível de conhecimento intermédio);
b) Finanças e Gestão Financeira (nível de conhecimento intermédio);
c) Contabilidade de Gestão (nível de conhecimento intermédio);
d) Fiscalidade (nível de conhecimento intermédio);
e) Direito Empresarial (nível de conhecimento intermédio);
f) Gestão de Risco e Controlo Interno (nível de conhecimento intermédio);
g) Auditoria e Asseguração (nível de conhecimento intermédio);
h) Tecnologias de Informação (nível de conhecimento intermédio);
i) Economia (nível de conhecimento básico);
j) Ambiente Organizacional e Empresarial (nível de conhecimento intermédio)
k) Gestão e Estratégia Empresarial (nível de conhecimento intermédio);
l) Métodos Quantitativos Aplicados à Gestão (nível de conhecimento intermédio);
m) Comunicação e Expressão (nível de conhecimento intermédio);
n) Comportamento Pessoal e Organizacional (nível de conhecimento intermédio);
o) Ética e Deontologia e Regulamentação Profissional (nível de conhecimento intermédio).
As matérias de exame são as mesmas tanto para contabilista certificado como para auditor certificado. No entanto, no exame para auditor certificado é exigido nível de conhecimento avançado nas matérias de:
a) Contabilidade e Reporte Financeiro (nível de conhecimento avançado);
g) Auditoria e Asseguração (nível de conhecimento avançado);
h) Tecnologias de Informação (nível de conhecimento avançado);
n) Comportamento Pessoal e Organizacional (nível de conhecimento avançado);
No que concerne o estágio profissional, estabelece que o estágio profissional é obrigatório, salvo as eventuais situações de redução ou de dispensa do estágio, contempladas no Regulamento de Admissão, Estágios e Exames. Refere que o estágio visa a obtenção da experiência prática necessária para o exercício da profissão, conforme estabelecido na International Education Standard IES 5, para contabilista certificado, ao que adiciona a IES 8, para auditor certificado.
Para contabilista certificado, fixa a duração do estágio em dezoito meses, se realizado a tempo integral, ou trinta e seis meses, se efetuado a tempo parcial. Para auditor certificado, fixa a duração do estágio em três anos, com o mínimo de trezentas e cinquenta horas semestrais, sendo que cada semestre e ano de estágio somente se consideram decorridos após o completamento das horas previstas.
O novo Estatuto da OPACC também prevê a transição da categoria de contabilista certificado para auditor certificado dos contabilistas certificados, admitidos na Ordem com base nos requisitos de inscrição estabelecidos neste novo Estatuto, os quais podem transitar para a categoria profissional de auditor certificado, desde que completem o exame para auditor certificado, nas matérias em que é exigido nível de conhecimento mais avançado, e completem um estágio profissional adicional de dois anos.
Alterações relevantes a nível das sociedades de contabilistas e de auditores certificados
O anterior Estatuto da OPACC estabelecia que as sociedades de contabilistas certificados deviam adotar a forma de sociedade por quotas ou anónima, ficando sujeitas à legislação comercial que regula o respetivo tipo societário, em tudo o que não contrariasse o Estatuto da Ordem.
Dizia mais que, só podiam inscrever-se na Ordem as sociedades de contabilistas certificados em que pelo menos setenta e cinco por cento dos sócios detinham essa categoria profissional.
O novo Estatuto da Ordem alarga para a possibilidade de as sociedades de contabilistas certificados poderem revestir a natureza de sociedade civil, dotada de personalidade jurídica, ou de sociedade por quotas ou anónima, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, em tudo o que não contrarie o Estatuto da OPACC.
No que respeita aos sócios, refere, agora, que setenta e cinco por cento dos sócios devem ser profissionais de contabilidade, portanto, não necessariamente contabilistas certificados, no entanto, esses últimos devem deter pelo menos setenta e cinco por cento dos direitos de voto e a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de direção da sociedade.
Por outro lado, o anterior Estatuto da OPACC estabelecia que as sociedades de auditores certificados deviam adotar a forma de sociedades civis, dotadas de personalidade jurídica, ficando sujeitas ao regime jurídico aplicável às sociedades dessa natureza, em tudo o que não contrariasse o disposto no Estatuto da Ordem.
Dizia mais que, pelo menos setenta e cinco por cento dos sócios deviam ser auditores certificados e que a firma deveria ser constituída pelo nome de todos os sócios, ou pelo menos de alguns deles, por extenso ou abreviadamente e, finalmente, que seria aplicável às sociedades de auditores certificados o regime das sociedades por quotas, no respeitante aos requisitos de capital social e entradas, administração, relatórios e contas do exercício e ainda subsidiariamente, nos casos omissos na lei civil.
O novo Estatuto da Ordem alarga para a possibilidade de as sociedades de auditores certificados poderem, não só, revestir a natureza de sociedade civil, dotada de personalidade jurídica, mas também de sociedade por quotas ou anónima, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, em tudo o que não contrarie o Estatuto.
De igual modo, e no que respeita aos sócios, estabelece, agora, que setenta e cinco por cento dos sócios devem ser profissionais de auditoria, portanto, não necessariamente auditores certificados, contudo, esses últimos devem deter pelo menos setenta e cinco por cento dos direitos de voto e a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de direção da sociedade.
Uma última novidade do novo Estatuto da OPACC, relativamente às sociedades de auditores e de contabilistas certificados, tem a ver com a admissão de formas de cooperação, ou seja, passa a ser permitido a essas sociedades participarem noutras sociedades, nomeadamente em sociedades que tenham por objeto exclusivo a consultoria fiscal e a consultoria em matérias relacionadas ou acessórias da contabilidade.
Introdução das matérias de ética, desenvolvimento profissional contínuo e controlo de qualidade
Para além de vagamente apontar para as boas práticas internacionais instituídas pela IFAC, o anterior Estatuto da OPACC era parco nas matérias de ética e deontologia profissional, desenvolvimento profissional contínuo e controlo de qualidade, pelo que as mesmas foram tratadas, pela Ordem, a nível de regulamento. O novo Estatuto da Ordem trata estas matérias em capítulos específicos para cada uma.
No que concerne a ética e deontologia profissional, refere os princípios fundamentais, nesta matéria, os deveres para com clientes, colegas, a Ordem e outras entidades, e estabelece que os honorários devem representar o justo valor dos serviços prestados ao cliente, tendo em consideração critérios de razoabilidade que atendam à natureza, extensão, profundidade e tempo do trabalho necessário à execução dos serviços contratualizados.
Mais impõe que, o Conselho Diretivo da OPACC deve submeter à aprovação da Assembleia Geral um Código de Ética e Deontologia Profissional que induza o respeito aos princípios e normas do Code of Ethics for Professional Accountants (Código de Ética para Contabilistas e Auditores), editada pela International Ethics Standards Board for Accountants (IESBA), organismo sob a égide da IFAC.
Relativamente ao desenvolvimento profissional contínuo, faz referência à norma IES 7 da IFAC, que o tem como condição indispensável à manutenção da certificação, do contabilista ou auditor, e refere a sua obrigatoriedade em conformidade com o respetivo regulamento interno, aprovado pelo Conselho Diretivo da OPACC.
Cita o objetivo do desenvolvimento profissional contínuo que se prende à necessidade de cada contabilista e auditor certificados estarem permanentemente atualizados com o estado da arte da sua profissão e de aperfeiçoar os conhecimentos e as competências necessárias à prestação de serviços de alta qualidade, de modo a salvaguardar o interesse público, em geral, e a satisfazer as necessidades dos seus clientes, empregadores e outras partes interessadas, em particular.
Estabelece que o desenvolvimento profissional contínuo é da responsabilidade de cada contabilista e auditor certificados, independentemente da forma de exercício da atividade profissional, devendo ser considerado um projeto de aprendizagem ao longo da vida, tal como impõe o Código de Ética para Contabilistas e Auditores, da IESBA, ao estabelecer que, por forma continuada e atualizada, cada contabilista e auditor certificados devem desenvolver e incrementar os seus conhecimentos e qualificações técnicas e as dos seus colaboradores.
Quanto ao controlo de qualidade, refere que todos os contabilistas e auditores estão sujeitos ao controlo de qualidade, o qual é exercido pela Ordem sob eventual supervisão de entidade externa, legalmente competente, e em conformidade com o respetivo regulamento interno, aprovado pelo Conselho Diretivo da OPACC.
Estabelece que o controlo de qualidade, a exercer pela Ordem, deve ter em conta os princípios e normas internacionais sobre a matéria, em especial as deliberações da International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB), organismo sob a égide da IFAC, nomeadamente a International Standard on Quality Control 1 (ISQC 1), bem como as melhores práticas adotadas a nível da supervisão e controlo de qualidade dos profissionais de contabilidade e auditoria certificados.
Refere a um plano anual de controlo de qualidade, a ser estabelecido pela Ordem, e à possibilidade de controlo de qualidade suplementar ao plano anual, em determinadas circunstâncias.
Alterações relevantes a nível da responsabilidade profissional e da responsabilidade disciplinar
Relativamente à responsabilidade profissional, o novo Estatuto da OPACC reafirma que os auditores e contabilistas certificados que exerçam a profissão de modo independente, bem como as sociedades de auditores e de contabilistas certificados são responsáveis por todos os seus atos profissionais, respondendo pelos mesmos na medida da sua culpa.
Por outro lado, estabelece que os auditores e contabilistas certificados que exerçam a profissão de modo independente, bem como as sociedades de auditores e de contabilistas certificados, são obrigados a contratar e manter atualizados seguros de responsabilidade profissional, de acordo com as condições estabelecidas pelo respetivo regulamento interno da Ordem.
A este propósito, retoma os critérios e ou os montantes já estabelecidos no regulamento de seguro de responsabilidade profissional e fixa o capital mínimo obrigatório do seguro, num valor correspondente a cinquenta por cento da faturação do contabilista ou auditor certificado e da sociedade de contabilistas ou de auditores certificados, no ano anterior, com um mínimo de 500.000$00, 750.000$00, 1.000.000$00 ou 1.500.000$00, respetivamente, por cada facto ilícito, feito a favor de terceiros lesados.
De referir que a Ordem negociou um seguro coletivo, com uma seguradora, e tem assumido o pagamento dos prémios e encargos correspondente a esse valor mínimo, devendo cada profissional ou sociedade assumir os prémios e encargos complementares, tendo em conta o capital mínimo do seguro que deve subscrever.
No que diz respeito à responsabilidade disciplinar, o novo Estatuto da OPACC sujeita os auditores e contabilistas certificados à jurisdição disciplinar exclusiva dos órgãos da Ordem, sem prejuízo do direito de recurso aos tribunais nos termos previstos na lei e no próprio Estatuto.
Refere que as infrações disciplinares, os tipos de penas e o respetivo regime sancionatório e, bem assim, a respetiva tramitação processual e regime de recursos, são obrigatoriamente estabelecidos por um regulamento disciplinar a aprovar pelo Conselho Diretivo, sob proposta do Conselho de Disciplina e Fiscalização.
Diz o que considera infração disciplinar do contabilista e auditor certificados, mormente a violação dolosa ou culposa de algum dos deveres consagrados no Estatuto e regulamentos da Ordem ou em leis e regulamentos aplicáveis ao exercício da profissão.
Estabelece que são também faltas disciplinares da sociedade de auditores ou de contabilistas certificados as praticadas por qualquer dos membros efetivos da Ordem que sejam seus sócios ou vinculados ao respetivo quadro técnico, e que o procedimento disciplinar contra a sociedade é independente do que couber contra os membros efetivos que sejam seus sócios ou pertençam ao respetivo quadro técnico.
Fixa o prazo de três anos para prescrição do procedimento disciplinar, reafirma que o pedido de demissão do membro da Ordem não faz cessar a responsabilidade disciplinar, e estabelece a hierarquia das penas disciplinares, caracteriza cada uma, faz a especificação dos factos e a graduação das penas, e determina a forma de registo e comunicação das penas disciplinares, bem como os seus efeitos.
Finalmente, refere ao regime geral do processo, à possibilidade de suspensão preventiva, à publicitação e comunicação das penas de suspensão e expulsão, bem como ao pagamento das despesas do processo e das multas, que, não sendo feito voluntariamente, pode ser cobrado coercivamente através dos tribunais competentes, constituindo título executivo a decisão condenatória.
Introdução da mediação e arbitragem na resolução de conflitos
Por último, o novo Estatuto da OPACC determina que os litígios entre os membros da Ordem e entre estes e a Ordem não devem ser levados a juízo sem que, previamente, seja tentada a sua solução por via de mediação e arbitragem. Também estabelece o novo Estatuto que a OPACC deve organizar e ou participar em centros de arbitragem, de competência genérica, em associação com outras entidades públicas ou privadas, em conformidade com a lei e com regulamentos elaborados ou reconhecidos pela Ordem.
CONCLUSÃO
O novo Estatuto da OPACC resulta da necessidade de atualizar o primeiro Estatuto da Ordem, aprovado pelo Decreto-lei nº 12/2000, de 28 de Fevereiro, tendo em conta a alteração do regime jurídico das Associações Públicas Profissionais, entretanto efetuada, e de introduzir no texto, de forma clara, os normativos internacionais aprovados pela IFAC, que devem servir de referência das boas práticas internacionais da profissão, referidas vagamente ou até ignoradas no anterior Estatuto da Ordem.
As maiores novidades do novo Estatuto situam-se a nível da regionalização, maior democratização e abertura da Ordem à sociedade, através dos órgãos regionais, consultas internas, regra da paridade na gestão da Ordem e da nova tipologia de membros, para além da decisão de dar combate ao exercício ilegal e irregular da profissão.
Por outro lado, as novas regras aplicáveis à constituição de sociedades de auditores e de contabilistas certificados virão descongelar muitas situações de pedidos de registo de sociedades, na Ordem, que se encontravam pendentes, por não cumprirem com as antigas regras estatutárias, para além de que é agora facilitada aos profissionais contábeis não certificados, a possibilidade de serem sócios das sociedades de auditores e de contabilistas certificados, onde exercem atividade, não obstante os profissionais certificados manterem a maioria nos órgãos de gestão. Para além disso, passa a ser admitida a participação das sociedades de auditores e de contabilistas certificados noutras sociedades cujo objeto exclusivo seja a consultoria fiscal e ou outras matérias relacionadas ou acessórias da contabilidade.
A nível da explicitação dos normativos internacionais de referência, são de salientar os capítulos do novo Estatuto sobre os regimes de exame e estágio, ética e deontologia profissional, desenvolvimento profissional contínuo e controlo de qualidade.
Finalmente, foram clarificados muitos aspetos da responsabilidade profissional e da responsabilidade disciplinar dos auditores e contabilistas certificados e das sociedades de auditores e de contabilistas certificados, e foi assumida a posição da Ordem relativamente à resolução de conflitos entre os membros da Ordem e entre estes e a Ordem, optando-se claramente pela via da mediação e da arbitragem, em que a própria Ordem se propõe assumir um papel enquanto organizador ou participante de centros de arbitragem.
Praia, 12 de Maio de 2020
Dr. João Marcos Alves Mendes
Auditor Certificado-Sócio-gerente da AUDITEC, Lda.